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October 24, 2004

[O Lado Negro - Parte IV - "Going Under"]

[O Lado Negro - Parte IV - "Going Under"]




"Passo o dedo pela ferida até o deixar coberto de sangue. Passo-o pela face, por baixo de ambos os olhos, deixando dois grossos e rubros riscos no meu rosto. Pinturas de guerra, do meu próprio sangue. Ergo a minha espada, aponto a lâmina ao paladino maldito e deixando o impulso devastador que me assolava tomar conta de mim, ataco-o impunemente."

Com uma força que nem eu percebi de que recônditas profundezas veio, ataco o sinistro cavaleiro com golpes violentos. Procuro não pensar; procuro não dar importância ao turbilhão que por dentro me devasta. Apenas atacar. Apenas lutar. Por tudo. Por nada.

Surpreendido, o espectro assume uma postura defensiva, esquivando-se ao meu ímpeto, desviando-se de alguns golpes, bloqueado outros. Consegue parar o meu último, e por momentos ficamos próximos uns dos outros, as nossas lâminas faiscando com a força com que se comprimiam uma contra a outra. Olhámo-nos olhos nos olhos com fúria e desprezo.

"Boa tentativa. Mas de que te servirá..?"

"É apenas o princípio..."

Sinto-me, ao pronunciar estas palavras, estranhamente confiante. Num ímpeto, empurro-o para trás, deixando-o sem defesa por breves instantes. Os instantes de que necessitava para lhe desferir um golpe violento no peito.

Sangue cobre-lhe agora a armadura, na zona do peito onde o atingi com força. Mas nem um esgar de dor esboça a negra criatura. Limita-se a rir. A rir baixinho.

"Julgas tu, Anjo Caído, que me podes derrotar assim? Feriste-me... e depois? Que dor me podem provocar os teus golpes, quando sou eu a tua dor? Que sofrimento me podes tu infligir enquanto em ti não acreditares, enquanto não tiveres verdadeira convicção de que tal podes fazer..?"

Esgazeado, vejo a ferida que lhe abri no peito fechar-se e sarar, como se nem lhe tivesse tocado. Dou um passo para trás, deixo cair a espada com estrondo. O choque é grande demais. Sinto o turbilhão reacender-se dentro de mim perante a cruel realidade que se me impõe e me esmaga. Crença. Crença em mim. A chave da minha vitória, a ausência da minha derrota.

Onde posso eu encontrar, essa crença em mim?

O negro paladino aponta-me a afiada lâmina, preparando-se para o golpe final. Fito-o. Sinto as forças a esvairem-se. Desvio o olhar, procuro nos negros céus de tempestade algum sinal de esperança, alguma luz...

Os meus olhos param subitamente quando se cruzam com o olhar cristalino da enigmática rapariga que, desde o início, imersa na sua própria luta que se não vê mas sente-se, me observa com uma expressão estranha que não consigo interpretar, um misto de compaixão e compreensão, talvez..? Na sua mão segura já com firmeza a sua espada... Olho-a amargurado, pensando em tudo o que ela representa, enquanto sinto a coruscante e mortífera lâmina do cavaleiro negro aproximar-se de mim...

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