[shifting dreams in a parallel universe - the same world, the same characters, the same past, a different story]
Uma vasta cidade envolve-me subitamente. É-me familiar a sua imagem, se bem que dentro de mim a sinta diferente, de alguma forma. Não voltava aqui havia muito tempo; no entanto, este espaço agitado e ainda assim melancólico fez parte de mim, do meu mundo, durante uma parte significativa da minha existência.
Caminho ao acaso pelas ruas parcamente iluminadas, envolto num sem-número de ruídos silenciosos de algum outro lugar que não este. Lentamente, um ténue nevoeiro dissolve os contornos das formas. Evoco este espaço na minha memória, revejo-me nele, se bem que todo ele se afigure diferente aos meus olhos neste momento. E porquê..?
Cruzo a rua, dou comigo no limiar de um jardim secreto, escondido, encaixado entre gigantescos prédios. Vejo-te. Revejo-te. Sentada num gasto banco de madeira, observas-me com um vago sorriso.
Aproximo-me, sento-me ao teu lado, fixo um qualquer ponto no vazio. O silêncio instala-se, cortado a intervalos regulares pelo frio da noite e por algumas palavras sem significado. Para onde foi ele, esse significado, verdadeira essência de uma amálgama de emoções condensadas em tão transcendente sentimento? Ergue-se entre nós uma barreira invisível, feita de desilusão e mágoa, de receio e de dúvida. Não nos tocamos, não nos vemos, sequer nos sentimos. Receamos falar, por motivos diversos que fatalmente convergem num mesmo silêncio espectral.
Levanto-me. Olho em volta, contemplo este pequeno jardim de Inverno onde as pequenas flores da Primavera murcharam há muito. Contemplo o céu sem lua onde a Estrela da Manhã não brilha e jamais brilhará de novo. Sinto-me vazio por dentro, tão vazio quanto esta cidade a fervilhar de vida. Da tua vida. Este lugar não é mais o meu. Não mais me pertence. Entraste num novo mundo, do qual não te posso pedir que abdiques, mas que também nele não posso entrar. Não tenho lugar nele.
Nada foi dito, penso. Nada será dito. Esperas que eu o faça, sinto-o de algum modo. Mas não o posso fazer. Não sem que desses o primeiro passo, não sem que tentasses ordenar este caos de sensações intermitentes, igualmente nostálgicas e dolorosas. Não sem que algo mudasses neste momento, não sem que algo me provasses...
Mas nada muda. Olho-te por uma derradeira vez. Afasto-me em silêncio, esmagado por este vazio que me invade e ocupa. Sinto que me vês afastar-me. E, pela primeira vez, quedas-te imóvel, observas-me partir, até eu desaparecer. Por um segundo julgo que me segues, que vens comigo. Ou que não me deixas simplesmente partir, que me fazes ficar contigo agora, sempre... mas no segundo seguinte essa sensação desvanece-se na tua imobilidade envolta em névoas, assim como se desvanece toda esta vasta urbe atrás de mim, no turbilhão violento do espaço caótico que existe em lugar nenhum.
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