[storm inside and out - thoughts in chaos I]
Sento-me à janela deste quarto soturno e relembro. Imagens difusas de tempos passados e futuros, cenários evanescentes que não sei se efectivamente vi. Cai a noite, nuvens de tempestade cobrem o horizonte, relâmpagos fulgurantes iluminam as trevas que o crepúsculo instala. Vejo-as, contemplo-as desta distância que decerto alcançarão. Não as temo. Sinto-me confortável no meio do caos exterior, do turbilhão que se inexoravelmente se aproxima, ameaçando a minha instalada melancolia.
Uma sucessão de intermitentes perguntas ocupa momentaneamente a minha mente, violentas como a tempestade longínqua que o meu olhar vazio fita. Não respondo, pois que há muito que as suas respostas se me escapam como areia entre os dedos quando nos meus tempos de criança a tentava suster. Exercício fútil, tão fútil como os pensamentos suicidas que me abalam. Que a morte defina a vida... mas que não a oriente, que não a governe. Jamais entenderei os devaneios da minha imaginação, mesmo os que qualquer um designaria de positivos, que há muito se evadiram dela. Não me entendo a mim; como poderei, então, almejar entender os outros..?
Estou sozinho mas não estranho. Não mais, que a ela já me acostumei há muito. Sabe-lo bem. Ainda assim, atreves-te a violar a minha melancolia solitária, atravessas as trevas do quarto, sentas-te a meu lado. Nada dizes, fitas a tempestade com um olhar nostálgico. Vejo os teus olhos azuis perderem-se nela, deixo-me embalar pelo ondular suave dos teus negros cabelos lisos ao vento frio da noite. Leio na tua expressão doce a minha dor, sinto na tua alma ardente a minha melancolia. Como tudo está tão errado, meu Deus..! Devaneios que não fazem sentido, recordações persistentes que se impõem e de seguida desaparecem, resoluções que tanto custam e que logo são anuladas... sinto-me tornar-me etéreo, desvanecer-me na brisa, envolver-me no centro em erupção da tempestade. Não estou aqui, estou em parte nenhuma. Perdido, encontrado, algures, onde? Não o sei, não o sabes, ainda que o soubesses... vejo-me em ti, não te vejo em mim, pois que nem eu me vejo mais em mim...
Recordo quem fui, quem sou. Reconstruo-me de novo a partir de fragmentos, como se estivesse a caminhar em cima de cadáveres do passado. Não sei o caminho que se esconde para além da tempestade. Não sei o caminho que se esconde para além do indigo dos teus radiantes olhos. Não sei...
... qual o sentido de tudo isto? É real, ao menos..?
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